top of page

PREÇOS CONTRATUAIS BAIXOS FOMENTAM O TRABALHO PRECÁRIO

  • Foto do escritor: José Carlos Marques Durão
    José Carlos Marques Durão
  • 15 de dez. de 2020
  • 3 min de leitura

Atualizado: 24 de fev. de 2022

Foi publicado no dia 11-12-2020, no Jornal Oficial da União Europeia, C 429/30, o Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Contratos públicos como instrumento de criação de valor e de dignidade no trabalho nos serviços de limpeza e de manutenção».


O que nele está exposto merece preocupação, até porque Portugal é um dos países onde muitos imigrantes trabalham nos serviços de limpeza. E, também, porque muitos portugueses espalhados pela Europa trabalham nesta atividade.


Destaco, do parecer do Comité Económico e Social Europeu (CESE), a seguinte observação: “A utilização do preço mais baixo como único critério de adjudicação dos contratos públicos compromete a prestação de serviços de qualidade e contribui para a deterioração das condições de trabalho (…). [1]


Na verdade, poderá ocasionar uma disputa cerrada pelo melhor preço. Pode propiciar a apresentação de propostas que não são sérias. Mas este desfecho também é alimentado pelos compradores públicos, quando o montante máximo que se dispõem a pagar pela execução do contrato – o designado preço base, previsto no art.º 47.º, do nosso Código dos Contratos Público (CCP) – é por vezes insuficiente para cobrir os encargos dos operadores económicos (empresas) que prestam o serviço. Se a isto lhe acrescentarmos um critério de adjudicação com ponderação elevada no fator preço[2] o resultado poderá culminar na adjudicação de uma proposta de credibilidade duvidosa e, posteriormente, na celebração de um contrato com sério risco de vir a ser incumprido. Diria que pontuação alta no fator preço são “promessas” de vitória e incentivos a preços baixos.


Neste cenário, uma forma perversa e ilegítima de “equilibrar o contrato”, é tomar medidas que têm efeitos nocivos para os trabalhadores. Por exemplo, exigir-se mais tarefas/horas e não pagar o valor correspondente aos trabalhadores.


A solução será um preço justo (no sentido de adequado e suficiente) que permita aos operadores económicos cobrir custos e obter ganhos. Depois exigência e rigor na fiscalização da execução do contrato por parte das entidades adjudicantes.


Neste âmbito, a nível nacional, a Resolução da Assembleia da República n.º 24/2020, de 13 março de 2020, recomenda ao Governo medidas de salvaguarda dos direitos dos trabalhadores do setor da vigilância e limpeza, designadamente, que se “inclua, nos cadernos de encargos dos concursos, referência de preços mínimos, que garantam o respeito pelos direitos laborais e impeçam práticas de dumping.”.[3]


Direitos laborais por vezes esquecidos - infelizmente. Foi notícia recentemente em França e que está a causar grande impacto naquele país, o atropelo aos direitos das mulheres portuguesas que trabalham nos serviços de limpeza.[4] Não propriamente por culpa dessa grande nação (onde liberté, egalité, fraternité são valores salientes e representativos da bandeira tricolor) a que muitos compatriotas e o desenvolvimento da Europa hoje muito devem. A responsabilidade deverá ser imputada a patrões ávidos por dinheiro e sem escrúpulos.


As entidades adjudicantes devem nas suas aquisições adotar medidas para garantir que os operadores económicos respeitam, designadamente, as normas aplicáveis em vigor em matéria social, laboral, e também que possibilitem combater o trabalho precário, ex vi n.º 2 do art.º 1.º-A e alínea l) n.º 6 do art.º 42.º, do CCP.[5]


Ao respeitar aquelas regras caminharemos para “(…) uma utilização dos contratos públicos que promova a qualidade do emprego e a dignidade no trabalho nos serviços de limpeza (…)” – objetivo primário visado pelo parecer do CESE.[6]


Uma empresa vive do lucro da sua atividade, um trabalhador vive do seu salário. Não são interesses antagónicos.


________________________________

[1] Cfr. 4.5 do Parecer do CESE.

[2] Relativamente à ponderação do preço o assunto é abordado, de forma pertinente, em 4.6. do Parecer do CESE. [3] Cfr. n.º 6 da Resolução da Assembleia da República n.º 24/2020.

[4]“Dans l’enfer des grands bourgeois du Nord: des femmes de ménage portugaises témoignent” - artigo de investigação jornalística, da autoria de Mickaël Correia – publicado no jornal francês “MEDIAPART”, em 15 de agosto de 2020.

[5] Neste caso do art.º 42.º, à luz das futuras alterações do CCP, objeto do DECRETO N.º 95/XIV, ainda não promulgado pelo Presidente da República – Sobre o diploma consultar:

 
 
  • White Facebook Icon
  • White Twitter Icon
  • Branco Ícone Google+
bottom of page